Uma das atrações suplementares
do Museu do Louvre é a corrida à Mona Lisa. De acordo com os números revelados
num documentário recente do canal ARTE, cerca de metade dos dez milhões de
visitantes/ano só entra no Louvre para ver a Mona Lisa. O Louvre tem uma coleção
espantosa de obras de arte e de peças de arqueologia. Mas é vê-los a transpor
os torniquetes da entrada, de máquina fotográfica em riste, a avançar em passo
apressado, passando indiferentes ao lado de magníficas obras, atropelando
outros visitantes, subindo impacientemente as escadas e dirigindo-se enfim à
sala onde a Mona Lisa está exposta. Da última vez que visitei o Louvre, já
havia, neste percurso desde a entrada do museu, setas a indicar o caminho para
a Mona Lisa.
Na sala onde a Gioconda está exposta há outras
obras-primas, desprezadas por grande parte dos visitantes, concentrando
a sua atenção na Mona Lisa. Concentrando a sua atenção é uma força de
expressão. O melhor da corrida à Mona Lisa é o final. Quando finalmente se
encontram em frente ao famoso quadro, muitas destas pessoas nem uns segundos se
dedicam a observá-lo. Mal chegam ao pé da obra, a prioridade absoluta é tirar
uma fotografia. Ao quadro e a elas e ao quadro. Sobretudo a elas e ao quadro. De
forma que viram as costas à Gioconda para a fotografia. Fotografia tirada, apreciam no ecrã o resultado entre comentários de satisfação. E já está.
Tirei esta fotografia - na qual
contei 5 pessoas a olhar para o quadro - um ano antes de
chegar a moda dos autorretratos a que agora dão o nome de “selfies”.
E foi ao ver a impressionante fotografia tirada esta semana numa ação de
campanha de Hillary Clinton (ver aqui) que me pus a imaginar a corrida à Mona
Lisa na era pós-“selfies”. E imagino, estarrecido, os visitantes todos de
costas para o quadro para tirar uma “selfie”. É difícil conceber imagem mais
absurda num museu. Mas se pensarmos bem nada de substancial mudou. Agora o
absurdo é apenas mais óbvio; se alguma vantagem trouxe a mania das “selfies”,
foi essa.
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