19.1.12

O dia em que regredimos décadas

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A proibição dos despedimentos sem justa causa (com consagração constitucional) é um dogma em Portugal, de tal forma que, pelo menos nos principais partidos portugueses, não há quem se atreva a pô-lo em causa ou, pelo menos, a discuti-lo de uma forma séria. Com uma dupla consequência nefasta: por um lado, temos, nesse domínio, uma das leis laborais mais rígidas do planeta; por outro lado, e à boa maneira portuguesa, têm-se multiplicado as formas de tornear aquela proibição, num sistema laboral cada vez mais incoerente e injusto.
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Há décadas que reina a hipocrisia no mundo laboral em Portugal, para tornear a enorme dificuldade de se despedir um funcionário neste país: o recurso aos recibos verdes (uma fraude bastante disseminada, que resulta, obviamente, em prejuízo do funcionário, que, além de poder ser despedido a qualquer momento, não tem acesso a direitos laborais básicos como as férias, as horas extraordinárias ou a licença de maternidade; e quando isto acontece dentro do próprio Estado, não é preciso dizer muito mais); o recurso em massa à celebração de contratos a prazo sem fundamento legal (também com perda de direitos), mas mais ou menos consentido pelo poder político (veja-se o ridículo “regime de renovação extraordinária” dos contratos a prazo publicado na semana passada no Diário da República - Lei 3/2012); o prolongamento, para além de todos os limites do absurdo, do período experimental; ou deixar ao empregador a definição dos critérios com base nos quais poderá depois despedir o funcionário, que constituiu a mais recente medida nesta área, delineada no acordo de Concertação Social anteontem celebrado, e que, na prática, se vai traduzir num despedimento sem justa causa mas mais humilhante para o funcionário que por esta via vier a ser despedido.
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Além da habitual hipocrisia em matéria de despedimentos – que acentua uma vez mais a injustiça do sistema laboral português -, o infeliz acordo anteontem celebrado traduz-se num retrocesso de décadas no domínio da qualidade de vida dos portugueses, sem justificação sólida e com o lamentável aval da UGT (cuja posição, reconheça-se, não era fácil) e a irresponsabilidade da CGTP (que mais uma vez optou por abandonar as negociações).
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