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A
aberração de país que esta gente que nos governa está a criar é um país em que é
o Ministério das Finanças que tem a última palavra na classificação do nosso património cultural!
O processo
de (ampliação da) classificação da Quinta de Recreio do Marquês de Pombal como
monumento nacional estava bem encaminhado. Foi iniciado na década passada, e ao
longo deste período de tempo o mérito da classificação deste património de relevância
nacional nunca esteve em causa. A formalização da classificação estava finalmente
prevista para junho do ano passado. Em maio, o governo aprovou o respetivo
projeto de diploma, que foi levado a Conselho de Ministros, para aprovação
final, em 27 de Junho. Segundo o que noticiou hoje o Público, um parecer do ministério das finanças, emitido na
véspera da aprovação (!), levou a que o Governo, à última da hora, fizesse abortar o processo (ao que parece, estará agora a ser iniciado um processo de
classificação de parte do imóvel como “conjunto de interesse público”, com um
grau de proteção muito menor e insuficiente para salvaguardar este património).
A Quinta
de Recreio do Marquês de Pombal (a chamada “quinta de cima”) constitui «momento
alto da história e da técnica de construção de jardins em Portugal», «com
algumas soluções e elementos únicos» (Rodrigo Dias, arquiteto paisagista que
estudou esta quinta), e inclui, nomeadamente, um notável sistema hidráulico projetado por
Carlos Mardel, com uma dupla e sucessiva função – de recreio (cascatas e
pequenos lagos / tanques) e depois agrícola (aproveitamento da mesma água) – e com uma
ligação direta à cozinha do Palácio do Marquês de Pombal (situado na chamada “quinta
de baixo”, classificada há muitos anos como monumento nacional).
Este
magnífico exemplar de jardim / quinta de recreio do século XVIII, onde ainda hoje se
produz um vinho único e de excecional qualidade (Carcavelos), sobreviveu quase
milagrosamente ao avanço selvagem do betão. A sua classificação como monumento
nacional constituiria a garantia da sua preservação. O aberrante “veto” do
ministério das finanças, alegadamente fundado no interesse em rentabilizar a
propriedade, é muito preocupante.
Pode
discutir-se qual a melhor forma de gerir este esplêndido espaço, que, diga-se, se situa em grande parte em leito de cheia (sendo de notar que há muitos anos
que a Câmara Municipal de Oeiras tem vindo a tentar, em vão, que o Estado lhe ceda
a quinta, ou parte dela, para que possa ser recuperada para ser usufruída pela população; Assunção
Cristas foi a última ministra a visitar o local). O certo é que a classificação do imóvel
como monumento nacional em nada conflitua com a sua “rentabilização” ou mesmo com
a eventual cedência da sua exploração a privados, para uso compatível com a classificação (diga-se
que uma parte da quinta está presentemente a ser explorada por privados, com o apoio
da Câmara Municipal de Oeiras); o país está cheio de exemplos de imóveis
classificados como monumentos nacionais cujos espaços estão a ser rentabilizados mediante exploração por privados. Em suma, mesmo que, por absurdo, a rentabilização pudesse constituir o critério decisivo da classificação de monumentos nacionais (!), essa seria uma
falsa questão, e, portanto, aquilo que a recusa da classificação como monumento nacional verdadeiramente significa é que está em risco a salvaguarda futura deste
património.
Das
câmaras municipais de Cascais e de Oeiras (em cujos territórios se situam os
bens que iam ser classificados) espera-se, no mínimo, uma dura reação. E que atuem
no sentido de se evitar o pior.
(P.S. - O
blogue Pombal do Marquês tem prevista a publicação de uma série de artigos sobre
a Quinta do Marquês de Pombal, cujo material tem vindo a
ser lentamente reunido nos últimos dois anos. Espera-se que entretanto não se anuncie
mais um crime contra o património: esta notícia não augura nada de bom...)
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