19.5.13

O “novo” Código das Expropriações

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A Ministra da Justiça - a mesma que recentemente afirmou, sem se rir, que já ‘tomou’ «mais do que uma medida estrutural por semana» na área da Justiça -, apresentou o projeto de um novo Código das Expropriações. Trata-se de um embuste, na sequência de outros do género a que a ministra nos tem habituado: o projeto não passa de uma revisão do Código das Expropriações de 1999, mas é formalmente apresentado como um “novo código” - mais uma pretensa “reforma estrutural” para a contabilidade da ministra.


A revisão do Código em vigor é fundamentalmente orientada pelo objetivo de uma redução de custos por parte do Estado. Neste ponto, reconheça-se, não se pode acusar o Ministério da Justiça de hipocrisia: pela leitura do preâmbulo do Projeto, fica claro que é isso que se pretende. Nomeadamente, as poucas alterações feitas em torno dos critérios de cálculo do valor da indemnização a pagar ao cidadão pela expropriação do seu bem mais não visam do que baixar as indemnizações a pagar pelo Estado, sem quaisquer preocupações de justiça. O cálculo da indemnização passa a ser reduzido a uma fórmula rígida, eliminando-se a cláusula de salvaguarda atualmente existente (que permite o recurso a outros critérios se daquela “fórmula” legal não resultar um valor justo de indemnização). A inconstitucionalidade do novo regime é flagrantíssima, por violação grosseira do princípio da justa indemnização consagrado no artigo 62.º, n.º 2 da Constituição, mas, já se sabe, o desprezo pela Constituição, por parte dos nossos governantes, está a tornar-se corriqueiro.


Uma das mudanças mais absurdas que o Projeto introduz consiste na transferência dos processos de expropriação dos tribunais judiciais (cujos juízes têm décadas de experiência no julgamento destes processos!!) para os tribunais administrativos. Esta mudança, contra todas as regras de bom senso, servirá um triplo objetivo: em primeiro lugar, permitirá reduzir o número de processos nos tribunais judiciais, para que posteriormente se possam exibir estatísticas favoráveis. Em segundo lugar, e tal como denunciou hoje o Conselho Superior da Magistratura, insere-se num processo de transformação do foro administrativo no «foro pessoal do Estado». Por fim, permitirá que os processos de expropriação se arrastem durante muito mais tempo nos tribunais (e, consequentemente, que as indemnizações aos cidadãos expropriados sejam pagas muito mais tarde), já que os tribunais administrativos são muito mais lentos e não têm, nem vão ter num futuro próximo, qualquer capacidade de resposta para acolher os processos de expropriação litigiosa. A alteração serve, pois, tudo isso, menos aquilo que realmente deveria servir: a justiça.


Esta alteração é tão grave que o Conselho Superior da Magistratura, convidado a dar parecer sobre o Projeto do novo código, vai referir-se apenas a ela no seu parecer, como noticiou hoje o Público. E não é seguramente por inexistência de outros pontos merecedores de dura crítica, que são numerosos neste Projeto...

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